terça-feira, 8 de junho de 2010

A colheita versus o desmatamento

Acabei de entrar no site da Agência Brasil e uma das notícias que mais me chamou a atenção foi a seguinte:

Safra recorde de grãos deve chegar a 146,9 milhões de toneladas, estima Conab Macedo
Repórter da Agência Brasil

Brasília - O bom regime de chuvas nas áreas de maior produção, o aumento da produtividade do milho no Paraná e em Goiás e o aumento da área plantada com esse cereal e a soja em Mato Grosso são os principais fatores que levaram a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) a estimar uma colheita recorde de 146,92 milhões de toneladas de grãos para a safra 2009/2010, que chega à fase final.

O resultado do nono levantamento desta safra, divulgado hoje (8), é 8,7% superior aos 135,13 milhões de toneladas colhidas no ciclo 2008/2010. A soja deve ser responsável por 68,7 milhões de toneladas, volume 20,2% maior que o da safra passada. A produção total de milho, somadas a primeira e a segunda safras, deve chegar a 53,46 milhões de toneladas, um aumento de 4,8% em relação ao ciclo anterior. Assim, as duas culturas representam 83,1% do volume de toda a safra de grãos.

Segundo a Conab, faltando menos de um mês para o final da safra, já foram colhidos 76% do arroz, 98% do milho primeira safra e quase todo o feijão. Apesar do recorde de produção, a área total plantada no ciclo 2009/2010 é 0,6% inferior à do período anterior, ficando em 47,4 milhões de hectares.

Para a safra de inverno, a estatal estima que a área de plantio do trigo deve totalizar 2,12 milhões de hectares, uma redução de 12,5% em relação à do ciclo anterior. A queda deve ocorrer principalmente nos dois maiores estados produtores, o Rio Grande do Sul e o Paraná, que detêm 89% da produção brasileira. A previsão é que sejam colhidos em todo o país 5,06 milhões de toneladas de trigo, contra os 5,88 milhões de toneladas da safra anterior.

A pesquisa de campo feita pelos técnicos da Conab com representantes de cooperativas, sindicatos rurais, órgãos públicos e privados ligados ao setor em todo o país foi realizada entre os dias 1° e 22 de maio.


Estimulante ler que a safra de grãos deve ser recorde. É um ponto importante para a economia brasileira, afinal esses grãos também são as chamadas commodities, negociadas no mercado externo.

Ok. Mas e a consequência? O texto da Agência só relata os números positivos da safra de soja, feijão e arroz. O primeiro desses itens, vale lembrar, é um dos causadores indiretos do desmatamento da floresta Amazônica, não é? Portanto, qual o impacto do aumento da safra sobre o meio ambiente? Para plantar é preciso desmatar. Onde antigamente eram grandes florestas distribuidas sobre a planície do estado do Mato Grosso, hoje são enormes plantações desse grão motivo de orgulho para fazendeiros.

Pesquisando sobre desmatamento no Google encontrei uma ONG chamada Conservação Internacional. Na área 'Quem somos' do seu site a organização se define assim: "A CI é uma organização privada, sem fins lucrativos, dedicada à conservação e utilização sustentada da biodiversidade. Fundada em 1987, em poucos anos a CI cresceu e se tornou uma das mais eficientes organizações ambientalistas do mundo. Atualmente, trabalha para preservar ecossistemas ameaçados de extinção em mais de 30 países distribuídos por quatro continentes."

O que interessa para este post é uma publicação que está disponível no site. O artigo "Desmatamento na Amazônia brasileira: história, índices e conseqüências", de Philip M. Fearnside, traz dados que são válidos para confrontar com o release do governo. Vejam trechos que extrai:

"Em 2003, a área de floresta desmatada na Amazônia brasileira alcançou 648,5 x 103km2 (16,2% dos 4 x 106km2 da floresta original da Amazônia Legal, que é de 5 x 106km2), incluindo, aproximadamente, 100 x 103km2 de desmatamento “antigo” (pré-1970) no Pará
e no Maranhão (Figura 1; INPE, 2004). O índice atual e a extensão cumulativa do desmatamento abrangem áreas enormes. A extensão original da floresta amazônica brasileira era, aproximadamente, equivalente à área da Europa Oriental." (p. 2)

"Antes do Plano Real, em 1994, a hiperinflação dominou a economia do Brasil durante décadas. A terra era muito valorizada e os preços atingiam níveis mais altos do que poderiam ser justificados como um insumo para a produção agropecuária. a retirada das florestas possibilitava reivindicações pela terra e o desmatamento para a formação de pastagens era o mais barato e mais efetivo nesse sentido, embora seja questionável até onde essa atividade era usada como especulação de terra (Hecht et al., 1988; Farninow, 1998; Fearnside, 987, 2002b)" (p. 2)

"O estado do Mato Grosso, sozinho, contabilizou 26% do total de 11,1 x 103km2 de área desmatada, em 1991, e tinha a maior porcentagem de suas terras privadas em fazendas
iguais ou maiores que 1.000 hectares (84% na época do censo agrícola de 1985). Por outro lado, o estado de Rondônia – famoso por seu desmatamento pelos pequenos fazendeiros – representava apenas 10% do total de 1991, e o estado do Acre, apenas 3%. O aumento para um índice de 23 x 103km2/ano, em 2002, mesmo com a economia interna sem vitalidade, pode ser parcialmente atribuído a um aumento da globalização
das forças de desmatamento, com um marcante crescimento do mercado internacional de soja e, em especial, de carne bovina. Anteriormente, a carne bovina restringia-se ao mercado nacional devido à febre aftosa (Alencar et al., 2004; Kaimowitz et al., 2004)." (p.4)

E agora dados mais atuais do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe):


"O sistema DETER – Detecção do Desmatamento em Tempo Real, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), registrou nos meses de março e abril, respectivamente, 51.79 km2 e 51.71 km2 de desmatamentos por corte raso ou degradação progressiva na Amazônia Legal, somando 103.5 km2.

A tabela abaixo mostra o total de desmatamentos verificados no bimestre pelo DETER para os estados da Amazônia Legal:



Informações complementares do Relatório de Avaliação DETEr de março e abril deste ano (disponível aqui):



"O desmatamento por corte raso é o processo de remoção total da cobertura florestal em um curto intervalo de tempo."

E ai? Não vale pensar se o crescimento da safra é bom ou ruim?

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