segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Etanol, propaganda e consumismo



 Não é sem motivo que estão chovendo propagandas sobre o uso do etanol combustível na televisão aberta brasileira. Um artigo do professor da USP José Goldemberg na página 2 do jornal O Estado de S. Paulo sobre a crise energética no Brasil deixa claro o que levou uma campanha tão forte para o público. Numa era em que ter automóvel parece ser muito mais uma necessidade social que real, a quantidade de carros circulando diariamente justifica a intensidade da campanha disparada pela União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica).

No artigo do Estadão, Goldemberg mostra os problemas dessa crise e o dado mais expressivo é a queda da produção, que caiu de 27 bilhões de litros por ano para 22 bilhões em 2012. Uma queda como esta parece preocupar o setor e justificar muito bem a campanha. Todas as vezes que assisto a esses comerciais os vejo quase como uma lavagem cerebral. É fato que ultimamente o preço do etanol parece não compensar tanto frente ao da gasolina - motivo para a alta desse preço também é exposta no artigo e envolve os preços dos fertilizantes usados nas lavouras de cana. Mesmo assim, a campanha está lá e parece mostrar um outro lado do combustível... o lado da geração de empregos e movimentação da economia. O discurso do comercial é claramente de fundo econômico e pouco importa as "qualidades" do combustível renovável.

E o que mais me chamou a atenção é o público alvo desta propaganda que envolve até crianças. O vídeo que selecionei para ilustrar essa matéria é justamente um dos que mais vi circular na mídia nestas últimas semanas. O ator Lucio Mauro Filho convence a motorista a abastecer seu carro com etanol por meio das duas crianças do banco traseiro. As vezes é útil assistir aos comerciais pensando em quais são as mensagens e quais são os públicos às quais elas se destinam. No conjunto, os comerciais da Unica parecem atirar para todos os lados para tentar reverter a crise do setor.

Hábitos de consumo

Enquanto o setor de energia discute a crise, acho que um outro tema deveria ser revisto: os hábitos de consumo dos brasileiros. O que parece acontecer hoje é que as pessoas não têm mais carros porque precisam fazer longas viagens a trabalho ou precisam dele para transportar os filhos e tudo o mais, ou seja, necessidades reais.

Basta olhar um grupo de jovens que acabaram de sair da adolescência e contar quantos deles possuem seus carros próprios para comprovar que ter um carro é como um bilhete de aceitação social, uma forma de garantir a inclusão num grupo chamado "classe média em ascensão" que consegue ter este bem, não importa quanto dinheiro perca, quantos meses tenham que pagar e nem quantas oportunidades de investimento abrem mão apenas para poderem desfilar por ai com o tal 'possante'.

Já presenciei casos de parentes que não tinham sequer perspectiva de fazer um curso superior, mas investiam o dinheiro que não tinham para garantir um carro, mesmo que usado. A necessidade não era real, mas sim apenas para a pessoa poder se inserir neste tal grupinho.

Enquanto isso, nosso trânsito vai ficando cada vez mais atolado e complicado e não se dá a devida atenção a alternativas de transporte coletivo. Melhorar o transporte público, ressuscitar a malha ferroviária para passageiros, pensar na construção de metrôs em cidades com grande crescimento e melhorar aqueles que já existem na capital... pouco parece ser pensado nestes assuntos afinal na nossa sociedade consumista o individual está sempre acima do coletivo e o meio ambiente não passa de discurso da moda que vai e vem das pautas e das rodinhas de bate-papo.

Nenhum comentário: