quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Toma que o problema é teu!

Se em Limeira, Félix e Eliseu se dão bem e apóiam-se mutuamente, há um outro político com o mesmo nome do chefe do Legislativo municipal que não deve estar muito contente com o prefeito daqui. O prefeito de Alvinlândia, Eliseu Jesus Eleitoeiro (PP), recebeu na tarde de ontem a notícia de que Félix está de olho em uma terra localizada no seu município e a ofereceu ao Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) para assentar os sem-terras hoje instalados no Horto Florestal de Limeira. O prefeito do município com cerca de 2.800 habitantes próximo de Marília, com uma voz não muito contente, comentou que não vai aceitar a mudança das famílias para sua cidade por ser pequena e não comportar os assentados.

No PABX da prefeitura de Alvinlândia uma voz informa: “Alvinlândia, cidade simpatia do Centro Oeste”. Na hora vem a pergunta à cabeça: será que a simpatia vai ser carro chefe da conversa entre Félix e Eleitoeiro caso os dois conversem algum dia sobre essa possibilidade de mudança do MST?

O prefeito daqui simplesmente propôs a terra de uma fazenda da “cidade simpatia” e mais duas outras áreas sem consultar nenhum dos prefeitos indiretamente envolvidos na negociação entre MST, Incra, Prefeitura de Limeira e União. A primeira terra da lista é referente à uma fazenda chamada São José, daqui de Limeira mesmo, com 87,12 hectares. Mais detalhes sobre essa fazenda são impossíveis por enquanto. De acordo com o Sindicato Rural existem várias Fazendas São José em Limeira e pelo nome ou área é difícil descobrir a localização exata do local. “Fazenda com nome de santo é o que mais existe”, comentou um dos funcionários do sindicato quando conversamos com ele hoje a tarde.

A segunda é a Fazenda Nossa Senhora de Lourdes, na cidade do xará do presidente da Câmara Eliseu Daniel dos Santos (PDT), com 183,92 ha. E a última que completa a lista que está agora sob análise da Advocacia Geral da União (AGU) no processo que trata da negociação entre MST e Prefeitura é a Fazenda Ocauçu, de Lupércio. Entrando em contato com os dois prefeitos, a surpresa e o descontentamento dos dois ficou mais que evidente ao telefone. Um deles ainda chegou a comentar: “É uma falta de ética do cara (Silvio Félix) fazer isso e não estar nos avisando porque nossa cidade é pequena, está trabalhando com o máximo de sua capacidade para atender o assentamento que já tem aqui e isso traria um impacto nos serviços públicos”, comentou.

Detalhes sobre o “ânimo” dos dois prefeitos estão na reportagem do Jornal de Limeira da edição desta quinta-feira. (Disponível aqui). Mas o que realmente está por detrás disso?

Limeira e MST são dois sujeitos que para algumas pessoas não poderiam dividir uma mesma frase a não ser que a palavra longe acompanhe o verbo estar: “O MST está bem longe de Limeira”. Um pensamento de certa forma elitista das pessoas que ou não aceitam a ideia da reforma agrária ou que alimentam preconceitos sobre a situação e a vida das famílias assentadas. Muitos pensam que assim como eles há pessoas que também são pobres e lutam para conseguirem comprar um espaço de terra e construir sua moradia ou ainda trabalham para pagar o aluguel. Mas qual será que é a realidade de alguém que decide se tornar um assentado? Além desse questionamento sobre a origem do movimento, uma pergunta mais fácil de ser respondida: que mal causa um assentamento para o município?

Em épocas que o MST não invade nenhuma outra terra, não é vitima de desocupações a força, ou não está na mídia, parece que ninguém lembra deles. Vivem nas terras que ocuparam, plantam o que comem, dormem dos barracos construídos sobre terra batida e pronto. Quando invadem mais alguma outra área, daí campanhas para salvar o Horto são feitas, discursos políticos são pronunciados e apesar de os dois lados serem ouvidos, a classe média continuar querendo que a cidade se livre desses “desocupados”, como alguns se referem à eles.

Não aprofundando no mérito do ideal do movimento, é pauta para se pensar o fato de Félix estar oferecendo uma área tão longe da cidade. Apesar de não ser boa para a diplomacia do prefeito em relação aos outros dois chefes dos Executivos das cidades próximas de Marília, essa classe média deve ver a medida assim como o prefeito deve estar enxergando. “Ele está se livrando de um problema e jogando ele para nossa cidade”, como bem disse um dos prefeitos entrevistados para a matéria do JL. Isso é justo? Algo que está incomodando no município será simplesmente transportado para outra cidade e eles que se virem por lá.

Dentro do acampamento do MST daqui de Limeira, como diz o coordenador do grupo, José de Arimatéia, há famílias limeirenses. Em 2008 entrevistei uma mulher que mora em um dos barracos do assentamento “Elizabete Teixeira”, na área do Horto Florestal. Ela tem filhos que moram aqui e tinha sua casa também. As dívidas a fizeram largar o imóvel na zona urbana e partir para o meio das plantações de cana, junto de outras pessoas que não têm água encanada e dependem da comida que recebem de doações. Ela seria então removida para “Alvinlândia, cidade simpatia”?

Antecipando a resposta de Félix: oferecemos três áreas. Uma em Limeira para as famílias assentadas que nasceram aqui e outras duas para as famílias que são de outra cidade e que aceitariam se mudar para as áreas ofertadas. Nessa ocasião volta o questionamento: é justo transferir o problema de um prefeito para o outro? Seria um belíssimo presente de grego porque junto de um assentamento vou ônibus escolares para levar as crianças até as escolas do município, água, serviços de saúde porque essas pessoas seriam atendidas pela rede pública de saúde das cidades e tudo o mais.

Se for essa uma decisão 100% política, futuramente as crianças de zero a três anos que estão sem creche, cujas famílias não têm dinheiro nem para pagar 50% de uma escolinha privada (pelo sistema do Bolsa Creche) também serão transferidas para cidades da região porque o executivo não consegue dar conta do problema?

“Toma que o problema é teu!”

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