quarta-feira, 24 de abril de 2013

Jogada no lixo...


A aula de Fundamentos do Jornalismo Cultural, no MDCC com o professor Celso Bodstein, entrou há algumas semanas no tema fotografia e as análises dessas imagens que rondam nossa vida a todo momento. Depois de passar pela Caixa preta de Flusser, hoje se discutiu a discussão de Boris Kossoy no livro "Realidades e Ficções na Trama Fotográfica" (2002). 

É muito interessante ter contato com essas discussões mais acadêmicas sobre um produto que se torna tão banalizado atualmente. Nem tudo que se produz em fotografia é Instagram e mensagens virais jogadas aos montes pelo facebook. Ler Flusser e Kossoy nos dá um instrumental para olhar para uma imagem e enxergar além do óbvio.

Kossoy define que a fotografia tem duas realidades. A primeira é a realidade ligada ao passado, a história particular daquele instante que foi registrado. A segunda realidade, no entanto, se liga a representação, ao assunto representado. Nas palavras do próprio Kossoy:

"A realidade passada é fixa, imutável, irreversível; se refere à realidade do assunto no seu contexto espacial e temporal, assim como à da produção da representação. É este o contexto da vida: primeira realidade. A fotografia, isto é, o registro criativo daquele assunto, corresponde à segunda realidade, a do documento. A realidade nele registrada também é fixa e imutável, porém sujeita à múltiplas interpretações" (KOSSOY, 2002, p. 47)

A partir daí, a fotografia é uma construção que começa desde a seleção do assunto até as infinitas interpretações que o receptor faz da imagem que tem diante de seus olhos. A fotografia e o fotojornalismo não escapam das discussões de subjetividade e angulação do produtor. A ação cultural de quem olha pelas lentes de uma máquina tem grande importância naquela documentação, mas é também a cultura do receptor que vai dar significação aquele quadro regitrado.

A partir dessa discussão foi proposto uma análise da fotografia que abre esse post. A fotografia de Micah Albert, foi premiada no World Press Photo. As análises foram as mais diversas numa turma que tem fotógrafos profissionais, historiadores e vários jornalistas com formações diferenciadas.

Eu enxerguei na primeira realidade um recorte da situação do Kenya que leva pessoas pobres a viverem entre o lixo, independente das condições climáticas do dia, buscando materiais reciclados para tentar sobreviver.

Porém, pendendo para a formação econômica e todo o discurso marxista e de desenvolvimento econômico, enxerguei na segunda realidade uma mulher que é fruto do capitalismo e do confronto de interesses que explodiram na Segunda Guerra Mundial e forçaram uma parcela da população africana, e até mundial, ao ostracismo  aumentando cada vez mais a divergência entre ricos e pobres. Apesar de ser jogada à margem do sistema e considerando que a economia trata a educação como instrumento primeiro e fundamental para transformação das bases da sociedade e da própria economia, a foto mostra a contradição entre o que o capitalismo produz (lixo e quem vive no lixo) e esse caminho essencial para o desenvolvimento e superação da pobreza e o que parece um caminho gigantesco e até impossível de ser trilhado.

Link da foto: http://www.worldpressphoto.org/awards/2013/contemporary-issues/micah-albert?gallery=6096

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