O
jornalismo deste final de semana trouxe a contradição aos leitores de O Estado
de S. Paulo e telespectadores do Globo Esporte. No primeiro, informações
diferentes apareceram no editorial do jornal e na coluna da jornalista Suely
Caldas, duas visões diferentes com caráter de informação em duas páginas da
mesma edição. Já na televisão a contradição se dá entre a programação geral da
emissora carioca e uma reportagem sobre a situação de um ginasta olímpico.
Vale
parar um pouco depois de ler e assistir às reportagens divulgadas e
televisionadas por estes veículos e contrapor as informações e a história de
quem é que está falando.
No jornalismo esportivo
Parece
ser senso comum que brasileiro gosta apenas de futebol. Afinal, qual é o
esporte considerado paixão nacional e qual é o esporte que mais recebe espaço
na cobertura do jornalismo esportivo? O futebol tem espaço garantido as
quartas-feiras na programação da Globo e provavelmente sempre terá espaço
quando precisar, vide as transmissões dos jogos da seleção brasileira. Sem
querer ir contra essa paixão dos brasileiros pelo futebol, acho que colocar
esse esporte ao lado de qualquer outro é humilhar esse qualquer outro quando se
trata de medir a atenção que eles recebem na mídia.
Partindo
dessa constatação é muito contraditório ver a emissora que deixou de transmitir
as Olimpíadas de Londres de 2012 fazer uma reportagem no domingo pela manhã
mostrando as situações precárias de treino de um ginasta olímpico, medalhista
de ouro naquela competição. Ressalva: uma reportagem curtíssima se comparada
com a que mostra vida de um jogador de futebol brasileiro que faz sucesso na
Europa e tem até peruca loura que imita seus cabelos a venda no mercado. O
ginasta da reportagem é Arthur Zanetti e a emissora mostrou como o atleta
treina hoje em dia depois de ter recebido medalha de ouro em 2012.
A
primeira reflexão é realmente a indignação de ver alguém que conquistou uma
medalha importante para o Brasil ter que treinar sem as condições mínimas para
tentar repetir o feito nas olimpíadas aqui no país. A segunda, no entanto, é
ver que quem fala do problema, de certa forma, ajuda a criar o mesmo problema.
Tenho a impressão de que se a Rede Globo tratasse a ginástica olímpica, o volei,
o basquete, ou qualquer outro esporte com a mesma intensidade que trata o
futebol, não só a visibilidade dessas modalidades aumentariam, mas também o
volume de patrocínios que eles recebem. Pra mim a lógica parece fácil:
visibilidade do esporte traz patrocínios que significa visibilidade para o
patrocinador. Afinal, basta reparar nas quadras e nas camisas dos times de
futebol: não são pequenas empresas que estão estampadas ali, são? E o que mais
as empresas querem nessa lógica capitalista são grandes e exorbitantes lucros. “Pouco
importa a forma como obtê-lo, mas se usar o esporte ajuda a promover a marca e
traz algum reconhecimento à empresa, então usemos”, parece pensar o dono do
dinheiro brasileiro.
Aqui
ainda vale resgatar o texto publicado no Observatório da Imprensa do
jornalista Thiago Forato: “A intenção da emissora é quebrar o monopólio?”
(edição 706 de 7 de julho de 2012).
Ao discutir a aquisição dos direitos de transmissão das Olimpíadas de Londres
pela Rede Record, o autor diz algo que se parece verdade pura quando se trata
de jogos olímpicos: “Entre novela
e Olimpíada, certamente a emissora carioca escolheria a primeira opção,
privando a maioria da população de acompanhar os jogos olímpicos.”
No jornalismo econômico
A
outra contradição está no jornalismo econômico. O editorial do jornal O Estado
de S. Paulo traz, para variar, mais um ataque à presidente Dilma Roussef: “Dilmês
castiço”. Quase no mesmo tom está o texto da colunista do caderno Economia
& Negócios, Suely Caldas: “Autonomia do BC – agora vai?”. Apesar das
semelhanças e dos ataques ao governo petista, os dois textos trazem duas
interpretações sobre um mesmo assunto que geram informações diferentes.
Ambos
relembram o desconforto gerado pela presidente no dia 27 de março quando ela
falou sobre inflação em entrevista coletiva aos jornalistas que acompanhavam o
encontro dos Brics (bloco econômico formado por Brasil, Rússia, Índia, China e
África do Sul), em Durban, na África do Sul. Naquela ocasião as edições dos
veículos anti-governo deram mais ênfase ao começo e ao final da fala da
presidente e ignoraram todas as outras palavras da presidente sobre o esforço do
governo contra a inflação. A interpretação das palavras de Dilma gerou alvoroço
no mercado financeiro devido às expectativas quanto à Selic. Frente à
repercussão a presidente convocou os jornalistas e disse que sua fala fora
manipulada, sem dizer, no entanto, quem manipulou suas palavras.
Resgatado
o cenário, o editorial do último domingo (21 de abril) O Estado de S. Paulo afirmou:
“(...) Imediatamente, a declaração causou nervosismo nos mercados em relação
aos juros futuros, o que obrigou Dilma a tentar negar que havia dito o que
disse. E ela, claro, acusou os jornalistas de terem cometido uma ‘manipulação
inadmissível’ de suas declarações, que apontavam evidente tolerância com a
inflação alta – para não falar da invasão da área exclusiva do Banco Central.”
(página A3 do jornal). Já a colunista Suely Caldas afirma: “Efeito imediato, a
taxa de juros no mercado futuro despencou. Irritada, ela acusou agentes do
mercado de manipularem suas palavras. Se tivesse ficado calada, nada disso
teria acontecido, o mercado não teria motivo nem respaldo para criar volatilidade,
instabilidade.” (página B2). Afinal, quem manipulou? Eu, leitor, fiquei
confuso.
Essa
contradição mostra diferentes olhares influenciados pela visão política de quem
escreveu o texto. É teorizado que a formação profissional e cultural influencia
na forma como o jornalista vê, avalia e escreve sobre um determinado assunto e
como o jornal transmite as informações aos leitores. Teoria essa que quebra os
discursos de objetividade. Essas visões ficam completamente expostas, claro,
num artigo opinativo. O perigo, porém, está na forma como essas elas são
usadas. A cobertura sobre a declaração da presidente no dia 28 de março foi extensiva.
Quando o Valor Econômico deu apenas uma página, O Estado de S. Paulo publicou
várias análises e entrevistas numa demonstração clara de desafeto com o governo
e/ou com sua política econômica.
Como
tentei expor no artigo anterior no Observatório da Imprensa (“Amanipulação e o jornalismo enviesado” de 9 de abril, edição 741)
o jornalismo econômico está mais político que econômico. Um professor de
economia da Unicamp me disse, na semana do dia 1º de abril, que os ataques ao
governo estão intensos mostrando um uso político desse noticiário. Ele concorda
que a Dilma não deveria ter respondido a questão do jornalista, mas não porque
ela não sabe o que diz, mas sim porque qualquer afirmação que ela desse seria
usada contra ela mesma, não no tribunal, mas na imprensa e, claro, nas eleições!
CONTIN,A. Alex. Contradições entre o quê e quem fala.Observatório da Imprensa (São Paulo), ed. 743. p. Digital, 2013.
CONTIN,A. Alex. Contradições entre o quê e quem fala.Observatório da Imprensa (São Paulo), ed. 743. p. Digital, 2013.
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Ilustração de como a Globo trata a Ginástica Olímpica:
Ou seja: não trata!
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