quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Alunos públicos em escolas públicas - esse é o caminho justo!


O número de estudantes de escolas públicas do ensino médio matriculados nos cursos de graduação da Unicamp aumentou de 2010 para 2011. Tudo bem, está um pouco tarde para falar sobre estatísticas e o crescimento é até pequeno, mas algumas pesquisas informais feitas recentemente dão algumas informações bem interessantes sobre o fato. Porém enquanto tentamos influenciar alguém a pensar na graduação como um futuro vantajoso, alguns adolescentes só pensam naquilo!
Uma das pesquisas foi feita no começo do semestre, em agosto, quando começamos o curso de Ciências Sociais para Economia na graduação de Ciências Econômicas na Unicamp. Como é de praxe com alguns professores, o primeiro dia de aula teve uma apresentação rápida dos alunos. O fato mais interessante é que de toda a sala, que devia estar com cerca de 40 alunos aquele dia, a grande maioria disse que estudou em escolas públicas no ensino médio.

O fato foi bem curioso e surpreendente até para o professor. Um certo consenso (com um quê de preconceituoso) nos faria pensar que em uma turma de futuros economistas só deveria haver alunos das melhores escolas particulares de Campinas e região (pensamento seguido por aquele olhar de desdém). Porém, o perfil dos alunos do curso de economia do período noturno é em si interessante. No vestibular de 2011 foram aprovados 35 alunos para esse período (ao todo 105 alunos ingressaram no curso de Ciências Econômicas na Unicamp: 70 no diurno e 35 no noturno).

Dos futuros economistas, uma parte considerável já está na sua segunda graduação. Ali tem formados em Jornalismo (eu), Imagem e Som, Relações Internacionais, História, Tecnólogo em Mecatrônica e Direito, além de outros alunos que já tinham cursado de um a três anos outra graduação na Unicamp ou em outras universidades públicas. Essa era uma informação que tínhamos desde o começo do curso, março, mas a quantidade de alunos vindos de escolas públicas foi algo novo.

NÚMEROS

Voltando à participação dos alunos de escolas públicas nas matrículas da graduação da Unicamp, alguns dados da Comissão Permanente para o Vestibular (Comvest) da Unicamp mostram valores consideráveis. A pesquisa está disponível no site da Comvest (WWW.comvest.unicamp.br) e os dados fornecidos são baseados nas informações que os vestibulandos fornecem durante o processo seletivo.

Foquei minha pesquisa na participação de alunos vindos do ensino médio das escolas públicas. Em 2010, dos 3.536 inscritos nas graduações da universidade, 1.030 (29,1%) informaram terem cursado o Ensino Médio em escola pública; em 2011, foram 1.148 (31,9%) dos 3.601 inscritos. Um aumento de 118 pessoas ou 2,2 pontos percentuais.

O crescimento parece pequeno, mas uma notícia divulgada pela Comvest mostra que a participação desses alunos foi recorde na Unicamp. A porcentagem mostra o impacto positivo do Programa de Ação Afirmativa e Inclusão Social promovido pela universidade, está entre as maiores dos últimos anos e reverte a tendência de queda verificada desde 2009.

Este fato deve ser estímulo para quem pensa que é impossível ser aprovado em um vestibular como o da Unicamp – e eu sei que existe adolescentes e mães que pensam assim, infelizmente. E mais...

Estatística dos matriculados em 2010

Estatística dos matriculados em 2011
Fonte: Comvest - Unicamp

COMPORTAMENTO

Essa informação se encaixa com os comentários que ouvi sobre o Unicamp de Portas Abertas (o famoso UPA) que ocorreu na última semana, nos dias 2 e 3 de setembro. Uma pessoa com quem conversei disse ter reparado o desdém de alguns alunos e o grande interesse de outros. O que me surpreendeu também foi quais alunos pertenciam aos dois grupos mencionados.

“Apelidamos o UPA de Unicamp de Pernas Abertas, o evento parecia uma micareta de carnaval, em todos os lugares tinha adolescente se beijando”, disse essa pessoa. Uma situação que deve ter sido vergonhosa de se presenciar em um ambiente acadêmico como a Unicamp. Depois de ter comentado que infelizmente os alunos de ensino médio de hoje em dia não têm mais interesse em cursar uma graduação e entrar para a vida acadêmica, essa fonte comentou que diferente do que pensávamos, os alunos de escola pública eram os mais interessados nas palestras e eventos do UPA, enquanto que quem se comportava como se estivesse em uma micareta eram os alunos de escolas particulares. “Só vão ao UPA os alunos de escola pública que estão realmente interessados em cursar algo na Unicamp até porque muitos não têm dinheiro para pagar a viagem até lá e por isso eles ficam bem interessados, fazem perguntas e participam de várias palestras”, disse.

Não podemos generalizar, mas é estimulante saber que alunos de escola pública estão tão interessados em ter uma graduação de qualidade e pública. É difícil se deparar com notícias que relatem eventos nas escolas de Ensino Médio do Estado que incentivem os alunos a escolherem uma graduação e os ajudem a entender melhor as profissões que pretendem seguir. Um dos professores do cursinho pré-vestibular que fiz no ano passado criticava as ONGs justamente por conta da inexistência de programas com essa finalidade para adolescentes e comunidades carentes.

A arte e o esporte têm seu valor de inclusão e proteção desses jovens contra a violência das ruas, mas nenhuma ONG ou escola parece se preocuparem com o que será dos estudos desses alunos depois do jogo de futebol ou da aula de capoeira. Na verdade o que falta ai é vontade de mudar a vida de alguém. Acredito que não seja difícil reunir uma vez por mês ou durante um dia todo profissionais das mais diversas áreas e/ou alunos de graduações diferentes para conversarem com esses jovens carentes sobre o que é ser um jornalista, um economista, um dentista, um físico nuclear ou qualquer outra profissão que passe pelos bancos das universidades. O que falta para esses jovens é perspectiva.

As escolas de ensino médio e fundamental têm um papel muito importante na formação profissional e pessoal dessas crianças e adolescentes a meu ver. Se os professores (quando há bons professores e motivados) deveriam estimular desde cedo a pesquisa sobre as diferentes profissões, mostrar às crianças as possibilidades de estudo e de trabalho que cada área apresenta e trabalhar os estudos desses estudantes com um foco direcionado à educação superior e à melhora da qualidade de vida que uma graduação pode proporcionar.

Fica aqui minhas constatações e uma sugestão simples de ser adotadas por professores e escolas estaduais: levem estudantes e profissionais para conversar com os alunos; estimulem os alunos que têm vontade de cresces e estudar; estimulem os pais desses alunos a enxergarem as possibilidades e benefícios que uma graduação pública pode fornecer aos alunos. Uma frase que um professor me disse uma vez se encaixa nessa hora: o bom mestre é aquele que faz o aprendiz superá-lo. Alguém pensa nisso hoje em dia?

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