Uma busca rápida na internet sobre o tema “Gestão de
pessoas” traz uma infinidade de resultados. Cursos de especialização,
artigos com “frases inspiradoras”, “pilares” ou qualquer passo a passo, são fáceis de encontrar entre as milhares de propostas disponíveis online. A questão,
contudo, é: o que é gestão de pessoas para quem está no final da linha, do
organograma ou no “chão de fábrica”? Apresentar essa visão é o objetivo deste
texto.
Falar o termo “Gestão de pessoas” é algo chique. É um dos
termos de um vocabulário empresarial que teve e ainda tem muito destaque quando
o assunto é gerir uma empresa e, principalmente, uma equipe de funcionários. A principal promessa é sempre o desenvolvimento
desses funcionários, independentemente de suas posições hierárquicas na empresa. Essa
promessa, contudo, parece ser mais palpável quando ela é apresentada a todos os
funcionários, exceto aqueles que trabalham nas atividades mais elementares de
uma companhia. Sendo assim, ela se torna muito mais uma ilusão que uma
possibilidade, principalmente em grandes empresas.
Dizer, por exemplo, que o mercado de trabalho é um ambiente
no qual "leão come leão" não é exagerar na adjetivação. A maioria das empresas
trabalha com um cenário pouco favorável para a colaboração entre os seus
funcionários, preferindo instaurar um local altamente competitivo. A competição
puxa a meritocracia que, por sua vez, leva à gestão de pessoas.
Sim, esta é, em partes, uma visão negativa de um termo tão
comumente usado em conversas com coordenadores e gerentes. Dizer que o
funcionário que trabalha no nível hierárquico mais baixo de uma empresa tem um
responsável pela gestão de seu desenvolvimento e crescimento na empresa pode
ser um discurso ilusório e manipulador. “Faça mais que você cresce!”, é desta
forma que geralmente a questão é apresentada. No entanto, a negatividade desta visão está relacionada
diretamente à falta de preparo de quem é colocado para gerir pessoas.
Essa
atividade não conta apenas com controle de escalas, folgas, férias e manutenção
da produtividade do funcionário. Ela deve ir além e usar todas as ferramentas
possíveis e imagináveis para lidar com um empregado. Apesar de existir inúmeras
ações ou instrumentos que podem ser usados nesta gestão, há duas que são
essenciais: comunicação e transparência.
As “ferramentas” fundamentais
Como apresentado, a gestão de um profissional deve ir além
do feijão com arroz – diga-se de passagem que é apenas quando o gestor consegue
ir além que ele está efetivamente gerindo alguém.
O ambiente de trabalho é um local altamente crítico.
Independentemente da empresa, quer ela seja nacional ou multinacional; grande
ou pequena; tradicional ou startup; as pessoas precisam trabalhar com ou sem
“gosto”/"vontade"/"motivação". Em um único escritório há funcionários com perfis que são extremos
opostos. Há o satisfeito e o insatisfeito com a empresa ou com a função; há o highperformer e aquele que faz só o que
lhe é pedido; há quem tem filhos e duplas jornadas e aqueles que voltam para a
casa dos pais depois do expediente e lá nada fazem. Listar todos os tipos e
perfis levaria, no mínimo, mais umas duas laudas. A questão, contudo, é:
entender o funcionário é primordial antes de qualquer coisa.
Esse entendimento passa, portanto, pela comunicação e pela
transparência. Apresento elas como “ferramentas” porque, embora básicas e
cruciais, essas duas palavrinhas são muitas vezes esquecidas durante um
diálogo (por incrível que pareça). A comunicação, por exemplo, está em todo lugar, porém, muitas vezes
ela é usada de forma errada. De nada adianta conversar com um subordinado e a
ele não dizer nada de relevante, ou seja, expelir um discurso pronto e
pré-formatado. Há inúmeras maneiras de dizer uma mesma palavra: com contextos
diferentes, tons de voz diferentes, ambientes diferentes. Embora a mensagem
seja importante, uma palavra não se sustenta sozinha na interpretação de ninguém.
Há, portanto, inúmeros fatores que contribuem para a efetividade da
comunicação.
O “momento adequado”, por exemplo, é um desses fatores. Como
disse anteriormente, o ambiente de trabalho é um local crítico. Em questão de
segundos tudo pode mudar. O slogan de uma rádio de notícias brasileira é
perfeito para este caso. De uma hora para outra uma insatisfação pode surgir em
um funcionário da equipe e ela se espalha tão rápido que a gestão de pessoas
passa a ser uma gestão de crises. Insatisfações acontecem e podem ser geradas
por infinitas causas e motivações. É neste ponto que a comunicação é essencial.
De fato, manter uma comunicação clara e constante com os funcionários ajuda a
evitar a maior parte das crises que podem impactar a atividade dos trabalhadores.
Saber os anseios e frustrações é mais importante que ouvir elogios e falsas
mensagens sobre o quanto este ou aquele funcionário está gostando de sua
função e da empresa.
A proposta é, portanto, questionar: “Quais são suas
reclamações?”. Aqui entra a transparência. Gestores de pessoas muitas vezes não
são os donos da empresa, porém, eles recebem tais função e cargos por estarem em
sintonia com os objetivos econômicos dela. Um gestor - quer ele seja
coordenador, diretor ou qualquer outro cargo acima dos funcionários do “chão de
fábrica” – é escolhido para manter as engrenagens limpas e funcionando. Isso
tudo é óbvio, mas a questão das reclamações deveria ser tão óbvio quanto, porém, não é o que acontece na maioria das empresas.
Ouvir o funcionário reclamar é uma das ações mais justas e
poderosas que qualquer gestor pode fazer. Contudo, não estamos falando de qualquer reclamação. Se
pensarmos em uma escala de complexidade, do assunto mais fácil ao mais
complicado, embora os gestores não devam ignorar nenhum discurso, a preferência
deve ser dada àqueles casos que parecem impossíveis e sem solução.
Você, leitor, pense em algo que você jamais teria coragem de
reclamar ao seu superior. Todos temos algum ponto que nos faz pensar duas vezes
antes de falar mesmo que a mensagem seja elaborada da maneira mais assertiva, respeitosa e política possível, certo? Pois é, aqui está o erro. Se é preciso pensar mais de
uma vez antes de fazer uma reclamação, algo está muito errado. Algo, na
verdade, não está transparente e a tendência é que piore com o tempo. Sabem a
máxima do “cliente satisfeito faz propaganda para X pessoas e um insatisfeito
faz para 10X”? Pois é, ela não funciona apenas com clientes e arrisco dizer que
ela é muito mais importante com os funcionários que com os clientes porque
insatisfação contamina e afeta a qualidade do atendimento ao cliente final. É possível dizer até que ela é uma praga, mas, ao invés
de ser combatida, ela precisa ser compreendida. A compreensão é a chave para
mitigar qualquer falha de expectativa que, consequentemente causa toda e
qualquer insatisfação.
Neste cenário, portanto, defendo que gestores não devem ser
aquelas pessoas que mais entendem do processo, que mais fizeram cursos de Recursos
Humanos, Gestão de Pessoas ou qualquer outro curso que é mais fácil de entrar e
concluir que jogar uma partida de truco com alguém que não conhece as regras do
jogo. Um gestor precisa, antes de qualquer coisa, ser uma pessoa empática e
corajosa. Empática porque precisa saber lidar, principalmente, mais com frustrações
que com qualquer outro assunto; corajosa, embora seja um atributo “simples”, porque ouvir reclamações sinceras e sem filtros não é algo para qualquer pessoa. Mais
que isso, saber interpretar essas reclamações, ser empático com elas e,
principalmente, ser sincero e transparente em uma resposta à ela é que é a
questão fundamental. No fundo, um "gestor de pessoas" precisa enxergar o valor das reclamações e incentivar o funcionário a ser "contra a empresa" para melhorá-la cada vez mais - este tópico, contudo, é tema para um próximo texto. =)